Análise do Comportamento: o que é e o que estuda

Esse artigo, como um texto conceitual/reflexivo tem por objetivo explicar teórica e conceitualmente a Análise do Comportamento, colocar em pauta os pressupostos dessa ciência, sua filosofia, definir seu espectro de estudo e desenvolver uma reflexão de sua aplicabilidade.

Tradicionalmente, estamos diante de uma questão antiga em psicologia, vem aí os behavioristas falar de ciência. Nós não nos furtamos a esse fim, pelo contrário, adoramos mensurar, fazer gráficos, falar de estatística, enfim temos nossa linguagem própria para falar de comportamento.

Vou buscar, gradualmente, migrar essa linguagem para um campo mais leve de comunicação e traduzir o linguajar da análise do comportamento. Mas não vou fazer isso hoje, vou reservar esse momento para os textos mais leves e aplicados que teremos no canal.

Hoje, vou abordar a Análise do Comportamento de forma mais técnica e apontar princípios fundamentais de nosso pensamento epistemológico, empírico e apontar sua aplicabilidade.

A “Análise do Comportamento” é uma abordagem da ciência psicológica. E como estamos iniciando nosso canal aqui no psico.club, acredito ser fundamental esclarecer seus detalhes, seus pressupostos, suas preocupações filosóficas e teóricas e seu objeto de estudo. Por outro lado, apresentar uma metodologia analítica cientifica e por fim sua aplicabilidade.

Como pensa um analista do comportamento


De início, vamos entender os pressupostos.

Como base filosófica, temos o Behaviorismo Radical, termo adotado por Skinner (1945), que discute e analisa basicamente “Qual a natureza do comportamento humano?”. Natureza no sentido de origem e causalidade, e na perspectiva de abordar temas de interesse psicológico, tais como: autonomia, liberdade, individualidade e outros.

O Behaviorismo Radical traz o operacionismo como estratégia de definição de suas reflexões e incorpora os fenômenos subjetivos sem precisar adotar as explicações mentalistas. Aprendemos e desenvolvemos uma forma de falar de comportamento sem nos referir a conceitos metafísicos, mentais.

E por que “radical”? Poderíamos ser apenas “behaviorismo”.

Na verdade, temos vários tipos de behaviorismo, no nosso caso, somos “radical” por preconizar a negação à causalidade por meio de eventos não físicos (inclusive, nesse sentido, eventos “mentais”).

E a própria expressão “radical”, no behaviorismo radical, implica eleger o comportamento como raiz para o acesso, a descrição e a explicação das atividades humanas nas suas relações com o ambiente. Somos radicais também no sentido de definir todo fenômeno psicológico como “comportamento”.

O modelo de determinismo adotado não é o absoluto, mas sim, probabilístico, ou seja, falamos em probabilidade de uma situação afetar ou influenciar outra.

No behaviorismo radical, como pressuposto para o entendimento dos processos comportamentais, temos 4 princípios fundamentais: o contextualismo, o pragmatismo, o funcionalismo e o monismo.

Vou definir cada um para termos um parâmetro de como pensam os analistas do comportamento.

  • O contextualismo é um princípio que define que a “verdade” se encontra no seu tempo e época. Portanto, se queremos entender os processos comportamentais, temos que recorrer ao momento histórico que ocorreu e considerar as variáveis da época.
  • O pragmatismo é valoriza o conhecimento que se converte a ser útil. Esse princípio agrega o paradigma explicativo funcional, nesse caso, descrever é explicar. Ou seja, precisamos construir uma ciência que parte da investigação básica de processos comportamentais para a produção de tecnologias e métodos aplicados. Vamos além da filosofia.
  • O funcionalismo preconiza como as “coisas” funcionam. A descrição das contingências fornece a funcionalidade da situação. É uma metodologia de entendimento e explicação funcional do processo analítico comportamental e carrega a característica de ser funcional e usar a análise funcional como método.
  • O monismo é um pressuposto que se contrapõe ao dualismo, ou seja, a natureza comportamental é única, física e material. Portanto, não exclui eventos internos, como pensamentos e sentimentos, mas entende eles como interação, ou seja, comportamento.

Todos esses pressupostos são a base, o guia, para o pensamento do analista do comportamento.

Aplicá-los é fundamental em qualquer situação de entendimento sobre comportamento humano. É importante entender que pressupostos não são evidências e sim um modo filosófico de pensar e toda ciência carrega os seus.

O que os analistas do comportamento estudam?


Outro aspecto importante é que a Análise do Comportamento, como abordagem, tem um compromisso e uma preocupação especial na definição do seu objeto de estudo. Afinal o que estudam os analistas de comportamento?

Parece óbvio dizer que é comportamento, mas este não é um conceito fácil de definir e de entender seus desdobramentos.

Como objeto de estudo, dizer “comportamento” significa muito. O termo foi alvo de reflexão por décadas até chegar numa definição operacional, ou seja, uma definição que englobe todos os fenômenos nesse campo de estudo e que permitisse mensuração, ou seja, medida.

Nesse sentido, comportamento pode ser definido como “a atividade dos organismos que mantêm intercâmbio com o ambiente”. Em outras palavras, comportamento é a interação entre organismo e ambiente e não o produto dessa interação.

Mas precisamos esclarecer os dois termos: organismo e ambiente.

  • O termo organismo refere-se ao aparato biológico, com sua capacidade filogenética de responder a estímulos.
  • Já o termo ambiente refere-se às variáveis independentes relacionadas ao comportamento.

Com um detalhe fundamental: ambiente é o que é externo à ação, não ao organismo. Ou seja, inclui uma parcela de estímulos internos, então, não seria correto conceitualmente, dizer que os estímulos relacionados ao comportamento são unicamente de fonte ambiental/externa.

Como desdobramento desse conceito, temos como comportamento o que pensamos, sentimos e fazemos (de forma pública e observável, acessível a observador externo).

Em outras palavras, temos a cognição (pensamento), o sentir (auto observação acompanhada de nomeação de estados internos) e o fazer (categoria de comportamentos motores).

Veja que incluímos todos os fenômenos psicológicos como comportamento, para nós, conceituar, estudar e desenvolver metodologia aplicada acerca de comportamentos do tipo pensar e sentir, não esbarra em limites, pois, são comportamentos como todos os outros.

Mas o que faz comportamentos serem aprendidos? O que mantem comportamentos em ocorrência?

Aqui entra outra ferramenta conceitual/analítica, o termo contingência. Analisar contingências e a forma de estudar comportamento.

Afinal, o que é contingência?

Contingência significa correlação, dependência de um evento em relação a outro, ou seja, é uma relação definida a partir da díade “se... então...”, que é um termo técnico que enfatiza a probabilidade de um evento afetar ou causar outros eventos.

Numa linguagem mais simples, seria o que chamamos de encontrar as “razões” para um comportamento ocorrer.

Essa “fórmula” (se... então...) é uma ferramenta útil nessa tarefa analítica, sendo que a cláusula "se" pode especificar algum aspecto do comportamento ou do ambiente. E a cláusula "então" especifica o evento ambiental consequente.

São relações entre o que acontece antes e depois do comportamento.

Por exemplo, “ao ver o sinal vermelho de transito, freio o carro”; “ao ver o verde, acelero” relação antecedente e “ao apertar o botão vermelho do controle da TV, em seguida ela liga” essa é uma relação consequente.

A princípio, conceitualmente, vou apresentar apenas esses dois conceitos, comportamento e contingência. No decorrer dos textos, podemos aprofundar e discutir outros conceitos fundamentais em análise do comportamento.

Análise experimental ou aplicada?


Um segundo aspecto importante em “análise do comportamento”, refere se a Análise Experimental do Comportamento, sua vertente empírica experimental.

Nesse caso, estudar comportamento implica em ter uma metodologia investigativa e que produza dados relevantes. As perguntas aqui giram em torno de questões mais processuais/práticas e não filosóficas. Cabe perguntar “Como comportamentos são aprendidos?”; “Qual o papel das consequências no controle do comportamento?” e outras.

É uma subárea que tem o compromisso de produzir e validar dados empíricos, sendo que o termo “Análise” refere se a uma tradição reducionista e indutiva, ou seja, primeiro estudamos as partes para depois entender o todo.

O termo “Experimental” refere se à forma de planejamento no qual a manipulação de variáveis é a estratégia adotada. Nesse caso, identificar relações funcionais equivaleria a identificar que variáveis antecedentes e consequentes afetariam, e como, a frequência de comportamentos.

O termo “Comportamento” refere se ao objeto de estudo a ser alvo da “Análise Experimental”.

Resumindo, a análise experimental do comportamento, como o próprio nome diz carrega três aspectos:

  • Análise (recorte entre A e B), ou seja, precisamos definir onde começa e onde termina o evento a ser estudado,
  • Experimental (característica que privilegia a manipulação de variáveis e avalia os efeitos), e
  • Comportamento (Variável dependente a ser estudada).

Em termos gerais, os processos comportamentais estudados em Análise Experimental do Comportamento, comtemplam:

  • Processos de aprendizagem (aquisição de novos comportamentos);
  • Processos envolvidos na ocorrência (o que mantêm o comportamento ocorrendo), e
  • Processos de modificação de comportamento (o que altera o comportamento).

A terceira vertente da “análise do comportamento” é a análise aplicada do comportamento. A tecnologia aplicada que se compromete a utilizar práticas validadas para produzir mudanças em comportamentos socialmente significativos.

Na Análise Aplicada do Comportamento, encontram-se as práticas profissionais tradicionalmente referenciadas como psicológicas, como o trabalho na clínica, escola, organizações, no esporte, enfim onde o comportamento se faz presente.

Essa subárea tem duas funções importantes:

  1. Primeira, alimentar os cientistas de perguntas relevantes que iriam guiar as pesquisas e,
  2. Segunda, disponibilizar uma tecnologia socialmente, uma tecnologia aplicada, o que no fundo é o que justifica o investimento em ciência psicológica.

Resumindo:


Análise do Comportamento, se subdivide em uma filosofia (Behaviorismo Radical), uma ciência (Análise Experimental do Comportamento) e uma profissão (Análise Aplicada do Comportamento) representada pelos analistas de comportamento.

Como mostra o desenho abaixo:


Para finalizar, se formos pensar com lupa, chegaríamos à conclusão que se estamos em busca de entender e intervir em comportamento, diríamos que o analista do comportamento não trabalha propriamente com o comportamento, ele estuda e trabalha com contingências comportamentais, isto é, com o comportar-se dentro de contextos.

Em suma, a prática do “Analista do Comportamento” é estudar contingências em seu efeito cumulativo no desempenho comportamental.

Autor Marco antonio chequer

Marco antonio chequer

@marcochequer

Marco Chequer é graduado em Psicologia pela PUC – MINAS. (1999); Mestre em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento pela PUC – São Paulo. (2002). Atua profissionalmente como Terapeuta Analítico-Comportamental de adolescentes e adultos no Instituto Comportamento desde 2003. Foi professor universitário de disciplinas em psicologia comportamental. (2000 – 2013) na Universidade Vale do Rio Doce. Pesquisador no Núcleo de Estudos em Análise de Comportamento e Prática Cultural. (NUCLEO ACPC). (2000 – 2013). Membro da Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental (ABPMC) desde 1996.

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