Como construímos nossa Imagem Pessoal

Já sabemos que ser humano é, antes de tudo, ser social e como a comunicação é a força propulsora da passagem da cultura humana geração após geração!

O que você talvez ainda não tenha se dado conta é que nesse jogo de grupos sociais e transmissão geracional a imagem pessoal constitui uma importante ferramenta de comunicação e, portanto, de construção de vínculos!

As habilidades de comunicação visual foram as primeiras a serem desenvolvidas pelos primeiros humanos a viverem sobre a Terra. Muito antes de desenvolvermos habilidades de escrita, fala e, até mesmo de simbolização. Essas habilidades visuais foram literalmente vitais (COSMIDES; TOOBY, 1992) para nossos ancestrais caçadores-coletores.

É justamente essa herança evolutiva que torna a comunicação visual tão prevalente, independente do nosso nível de consciência a seu respeito, e assertiva. Trata-se de um processo espontâneo, automático e vinculado ao funcionamento da amígdala (WINSTON et al, 2002)

Se você prestou atenção às aulas de neuroanatomia você provavelmente lembra-se que a amígdala está diretamente associada ao processamento das emoções, em especial aquelas mais primitivas como a raiva, o medo e o tal instinto de sobrevivência.

Dá pra ter uma ideia de porque a nossa imagem pessoal assume tanta relevância no nosso desenvolvimento psicológico e social não é mesmo?

Mas, para além das questões evolutivas, e em busca de respostas mais individualizadas, é preciso considerar também o desenvolvimento humano que envolve o estudo de variáveis afetivas, cognitivas, sociais, culturais e biológicas em todo o ciclo de vida.

Assim como o contexto social e cultural em que estamos inseridos está para o nosso desenvolvimento e para a construção da nossa identidade, está, também, para a construção da nossa imagem pessoal.

Principalmente se considerarmos que a nossa imagem pessoal nada mais é do que uma representação da nossa identidade. Por isso o estudo do desenvolvimento humano é crucial para compreender como formamos nossa imagem pessoal, nosso estilo, autoimagem e autoestima.

  1. Nesse sentido, em um nível MACRO o estudo do desenvolvimento humano atrelado à imagem pessoal nos permite compreender o desenvolvimento de padrões, estereótipos, a evolução cultural e social da moda e como a moda acompanhou a evolução humana.
  2. Em um nível MICRO possibilita a compreensão de como a construção da nossa imagem pessoal se relaciona, influencia e é influenciada, com o desenvolvimento da nossa identidade, com a forma como realizamos as passagens pelas etapas do ciclo vital e as conquistas decorrentes de cada uma dessas etapas. Como as primeiras experiências com o nosso corpo e com as roupas influenciam no nosso desenvolvimento e na construção da nossa identidade, qual o papel e influência das pessoas de referência ao longo da nossa vida, etc.

Identificar esses pontos ajuda a validar o diagnóstico e a planejar as intervenções uma vez que levanta eventos traumáticos, conflitos emocionais e interpessoais, habilidades aprendidas ou não, a origem de crenças (limitantes ou não) e valores pessoais, dentre tantas outras informações essenciais para uma intervenção bem sucedida e duradoura!

Desenvolvimento Humano e Imagem Pessoal


Assim com nós seres humanos, a Psicologia do Desenvolvimento também teve a sua evolução e eu julgo importante compreendermos de onde viemos para melhor compreender onde estamos!

Junto com a chegada do século XXI novos paradigmas na psicologia do desenvolvimento começam a emergir. A dimensão histórica toma maiores proporções e cada vez mais o desenvolvimento é estudado ao longo de todo o ciclo vital.

Nessa direção a perspectiva mais abordada recentemente, pelo que eu vi por aí pesquisando para este artigo, é a teoria psicossocial de Erick Erikson, que inclusive têm sito utilizada como referência em cursos de Psicologia. Eu particularmente gosto dessa abordagem e como você verá daqui a pouco ela elucida bastante a correlação entre desenvolvimento e imagem pessoal.

Mas, antes de falarmos sobre a teoria de Erikson, gostaria de falar sobre dois consensos apontados por Mota (2005).

  1. O primeiro diz respeito à inclusão do estudo da vida adulta e da velhice, havendo um consenso de que o estudo do desenvolvimento humano deve abarcar todas as etapas do ciclo vital.
  2. O segundo diz respeito à incorporação do contexto nos estudos do desenvolvimento a partir do relativo consenso entre cientistas de que o desenvolvimento ocorre no contexto.

Esses posicionamentos reforçam a minha escolha pela Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) como base para atuação no contexto da imagem pessoal. Se você ainda não leu o artigo do mês passado e sugiro que o faça o mais rápido possível, mas vou te dar essa colher de chá:

A ACT é embasada por uma filosofia chamada Contextualismo Funcional que considera que todo comportamento está incluído em um contexto situacional e histórico e que todo organismo interage em e com um contexto. Dessa maneira a predição e influência do comportamento dependem da identificação das variáveis contextuais que provocaram esse comportamento.

Como pesquisas indicam, as interações sociais e os valores pessoais de cada pessoa impactam diretamente nas escolhas que essas pessoas farão, ao longo de sua vida, em relação a sua imagem pessoal.

Todo o processo que envolve a construção de uma autoimagem e apresentação visual de uma pessoa é composto por comportamentos aprendidos ao longo da vida (desenvolvimento humano!) que podem estar embasados em regras rígidas, levando a construção de crenças limitantes, inflexibilidade comportamental e, portanto sofrimento.

Na minha experiência clínica rapidamente notei que havia um padrão muito específico relacionado ao momento de vida pelo qual as mulheres estão passando quando me procuram. A imagem pessoal é ponto estrutural na construção da nossa identidade e a cada etapa do ciclo vital acompanha as transformações decorrentes dessa passagem. Em cada etapa essa transformação é pautada pelas questões envolvidas com esses ciclos, o que será detalhado daqui a pouco.

Por hora gostaria de ressaltar, retomando o texto anterior que você já leu, a importância dessa reflexão entre “quem eu sou”, “como eu me vejo” versus “quem eu quero ser”, “como eu quero ser vista”.

À passagem de cada etapa novas competências são adquiridas que estruturam a identidade e personalidade do indivíduo proporcionando um sentimento cada vez maior de unidade e coerência interior, uma sólida identidade pessoal. Caso essa passagem não se dê de maneira positiva ou sem o suporte necessário o resultado é uma identidade difusa e frágil.

Essa correlação se aplica a imagem pessoal na mesma medida:

  1. De uma resolução positiva vemos o desenvolvimento e incremento de uma imagem e estilo coerentes com a identidade do indivíduo, uma autoimagem saudável e o crescimento da autoestima e empoderamento.
  2. De uma resolução negativa observamos o não reconhecimento, baixa autoestima, distúrbios alimentares e de imagem, desconhecimento do próprio estilo, pouca intimidade com o próprio corpo, insegurança, etc.

Como essas etapas são interdependentes e promovem uma evolução constante da identidade individual, Erickson afirma que a personalidade que construímos na infância não é fixa e pode ser parcialmente modificada pelas experiências e aquisições decorrentes das passagens de ciclo posteriores (RABELLO & PASSOS). Ou seja, estamos em constante evolução e mudança! E cada etapa do ciclo vital traz mudanças e contextos específicos.

Por isso dizemos que a nossa imagem pessoal e estilo estão em constante mudança e evolução, porque eles acompanham as etapas do ciclo vital e suas temáticas. Claro que ao menor sinal de mudanças muito drásticas e pouco coerentes deve-se ligar o alerta. Como bem diz Erickson é possível realizar mudanças parciais! Tudo isso porque a base da nossa identidade, assim como a base estrutural da nossa imagem muito provavelmente permanecerá a mesma ao longo da vida.

O que realizamos são pequenos ajustes e adaptações conforme os contextos impostos em cada ciclo. Para exemplificar: o contexto que vivemos no início da vida adulta, normalmente relacionado com início de carreira, formação de família, etc, são diferentes e demandam recursos e habilidades diferentes, em certa medida, do contexto que vivenciamos em uma idade mais madura e estabilizada, como ocorre normalmente na faixa dos 50-60 anos.

Vamos à descrição das 8 etapas:


Vou tomar a liberdade de correlacionar essas etapas com faixas etárias, mas já pontuando que a demarcação de idades é até certo ponto arbitrária e apenas para fins didáticos.

A passagem por cada ciclo varia de pessoa para pessoa e pode, com alguma frequência, ocorrer de maneira precoce ou tardia, variando conforme fora a passagem das etapas anteriores.

1) Confiança Básica X Desconfiança Básica (nascimento ao primeiro ano):

Essa etapa se inicia com o nascimento e é marcada pela relação com um outro que provém todos os cuidados e necessidades do bebê, normalmente sendo essa a figura da mãe. Essa fase é importante porque é aqui que se estabelece a nossa primeira relação social!

Se essa relação é positiva e o bebê se sente amparado em suas necessidades, compreende que é possível querer e esperar, porque será atendido, ele entende que objetos e pessoas existem, mesmo que temporariamente fora do seu campo de visão. Ele aprende a confiar na constância de seus provedores e essa confiança nos outros se transforma também em autoconfiança. (RABELLO & PASSOS)

Caso essa relação seja negativa e não haja previsibilidade em seus cuidados o bebê se sente desamparado em suas necessidades, desenvolvendo um sentimento de desconfiança. Da mesma forma esse sentimento se estende autoreferencialmente.

Note que características muito fundamentais da nossa personalidade, diretamente ligadas ao nosso nível de segurança e confiança, já começam a se moldar. Erikson aponta que essa dinâmica não deve implicar na ausência de frustrações. É importante que a criança viva pequenas frustrações, pois é a partir delas que ela desenvolve um senso de realidade e expectativas ao aprender quais esperanças são possíveis de serem realizadas e quais não são.

De maneira geral a importância da conquista dessa confiança implica que a criança “não só aprendeu a confiar na uniformidade e na continuidade dos provedores externos, mas também em si próprio e na capacidade dos próprios órgãos para fazer frente aos seus impulsos e anseios” (ERIKSON, 1987, p.102).

2) Autonomia X Vergonha e Dúvida (até os 3 anos):

Essa etapa é marcada pela aquisição do controle motor, principalmente aqueles relacionados aos esfíncteres, o que dá início a uma fase de atividade exploratória e de busca por autonomia. Entretanto, Erikson aponta que esse controle se estende para as relações sociais da criança. É nessa fase que observamos um comportamento de querer manter algo próximo e, logo posteriormente, rechaçar esse objeto ou pessoa violentamente.

Não a toa é nessa fase que observamos as primeiras reações de uma criança ao modo como ela é vestida e as primeiras inciativas de querer realizar essa tarefa, entre tantas outras, de maneira autônoma. Todo esse poder que a criança adquire em reter e eliminar se converte no que Erikson chama de uma batalha pela autonomia” (BOSSI et al, 2010).

Rabello e Passos apontam que a maneira como os adultos lidam com a criança nessa etapa é fundamental É aqui que a criança aprende a seguir regras e tem sua primeira experiência com o controle social, e como maneira de ensinar essas regras é frequente o uso de autoritarismo e de vergonha.

O problema é que essa estratégia pode desenvolver na criança habilidades de dissimulação ou sentimento de dúvida e vergonha. E sabemos que a vergonha é um sentimento profundamente danoso e bastante difícil de superar!

De um sentimento de autocontrole sem perda de autoestima resulta um sentimento constante de boa vontade e orgulho; de um sentimento de perda do autocontrole e de supercontrole exterior resulta uma propensão duradoura para a dúvida e a vergonha (ERIKSON, 1976, p.234)

O ideal é que a criança seja conduzida a um aprendizado de regras e autocontrole sem a necessidade de comprometer a sua autoestima para isso. Desse aprendizado nasce a força básica da vontade, que se manifesta através da livre escolha e é essencial para um desenvolvimento sadio da autonomia.

“Se a criança se sentir envergonhada demais por não conseguir dar conta de determinada coisa ou se os pais reprimem demais sua autonomia, ela vai entender que todo o problema dela, toda a dúvida e a vergonha vieram de seus pais, adultos, objetos externos. Com isso, começará a ficar tensa na presença deles e de outros adultos, e poderá achar que somente pode se expressar longe deles” (RABELLO & PASSOS)

E gente, como eu vejo isso no consultório! É muito comum encontrar mulheres que não internalizaram suas referências e essa autonomia básica e acreditam que não são capazes de definir e sustentar uma imagem satisfatória sem uma validação externa.

E não estou dizendo que esse desenvolvimento se dê por completo aqui nesse momento não! Mas esse tipo de comportamento, quando já dá sinais logo aqui, costuma se estender ao longo da vida da criança. Cabendo a essa mulher, quando mais madura e autônoma concretamente, desenvolver essa referência interna e essa autonomia básica dentro das suas possibilidades e do seu contexto.

Percebe como essa etapa é crucial para o desenvolvimento de uma autoestima e autoimagem saudáveis? É aqui que se dão as primeiras experiências conscientes que nós temos com nossas roupas, com nosso corpo, com o estilo que nossos cuidadores (ainda) nos determinam, etc. E a forma como absorvemos ou rechaçamos tudo isso é fundamental para definir sentimentos básicos em relação a nossa imagem pessoal!

3) Iniciativa X Culpa (3 aos 6 anos):

Nesse momento a criança já desenvolveu a confiança e a autonomia. Cabe agora associar essas duas à iniciativa. É essa combinação confiança+autonomia que promove na criança um senso de determinação que alavancará a sua iniciativa.

E esse momento coincide com a entrada da criança na vida escolar! Por isso se diz que o desenvolvimento da iniciativa se dá através da expansão intelectual (RABELLO & PASSOS). A alfabetização e ampliação do círculo social que a entrada na escola promovem impulsionam o desenvolvimento das capacidades de planejamento e realização da criança.

Aqui a imaginação será ferramenta amplamente utilizada para o aprendizado de papéis, com destaque para os comportamentos socialmente definidos para meninos e meninas. Além de treino para coisas que ainda estão fora das suas capacidades.

Erikson alerta para o perigo da personificação. Quando a criança, tentando escapar da frustração de ser incapaz para algumas coisas, exagera na fantasia de ter outras personalidades, de ser totalmente diferente do que é várias vezes, ela pode se tornar compulsiva por esconder seu verdadeiro “eu”; nesse caso, pode passar a sua vida desempenhando “papéis” e se afastar cada vez mais do contato consigo mesmo. (RABELLO & PASSOS)

Reconhecem esse movimento?

Nessa etapa a experiência da criança é pautada pelas primeiras vivências com outras crianças e grupos sociais extrafamiliares, proporcionadas pelo ingresso no mundo escolar. Cabe, portanto, investigar: como essa passagem ocorreu? Quais eram as fantasias que ela tinha nesse momento? Quem ela imaginava ser? E como isso tudo impactou no desenvolvimento da sua autoimagem e no seu estilo próprio? Ou se aqui ela vestiu a fantasia (ou armadura) e nunca mais tirou?!

4) Diligência X Inferioridade (6 aos 11 anos):

Aqui a vida escolar é o palco. As relações com outras crianças ainda é destaque. A criança aumenta seu convívio extrafamiliar e passa a se identificar com professores e pais de outras crianças, observando e imitando seus comportamentos, representando, principalmente suas ocupações.

É nesse momento que aparecem os primeiros pensamentos em relação ao futuro e as primeiras falas sobre “o que quero ser quando crescer”. Nesse momento a criança sente necessidade de ser reconhecida em suas produções, desenvolvendo ideias de propósito e perseverança, reconhecendo a existência de compensações de longo prazo.

Dessa fase também se desenvolvem as noções de habilidade e competência sendo, socialmente, uma das etapas mais decisivas. “O perigo dessa fase é o desenvolvimento de uma alienação em si mesma e das tarefas – o tão conhecido sentimento de inferioridade” (ERIKSON, 1972, P.124).

5) Identidade X Confusão de Identidade (11 aos 20 anos):

Entramos na puberdade seguida pela adolescência, fase considerada por muitos como a mais turbulenta e para Erikson fundamental para a integração de todas as experiências vividas até então e para a consolidação de uma identidade coesa e coerente.

Esse período é marcado pela comparação entre “o que possam parecer aos olhos dos outros, com o que eles próprios julgam ser, e com a questão de como associar papéis e aptidões cultivados anteriormente” (ERIKSON, 1972, p. 129). Portanto é aqui que surgem questionamentos da ordem da identificação versus diferenciação: sou diferente dos meus pais? Quem eu sou? Quem eu quero ser?

É da resposta a essas questões que emergem as escolhas que esses adolescentes farão para a sua vida como, por exemplo, carreira, relacionamentos amorosos, estilo pessoal, etc.

Aqui o papel dos grupos sociais torna-se ainda mais importante e surge o envolvimento ideológico que, segundo Erikson, é o que comanda a formação desses grupos. A necessidade de se sentir pertencente e apoiado em suas ideias e em sua identidade é fundamental nessa etapa.

Toda a preocupação do adolescente em encontrar um papel social provoca uma confusão de identidade, afinal, a preocupação com a opinião alheia faz com que o adolescente modifique o tempo todo suas atitudes, remodelando sua personalidade muitas vezes em um período muito curto. (RABELLO & PASSOS)

É um momento de experimentar diversos papéis e identidades para que se possa escolher a mais compatível conosco e com nossos anseios. É muito comum nesse momento observarmos também uma experimentação de estilos e imagens pessoais distintas. Tudo isso faz parte dessa construção.

Crianças que tiveram uma experiência negativa podem, nesse momento, romper com o estilo e imagem impostos pelos seus cuidadores, adotando algo totalmente divergente e até mesmo chocante. Demarcando uma diferenciação e independência da sua identidade. Outros podem passar por essa fase sem grandes rupturas e turbulências, principalmente se houve na infância uma identificação e experiência positiva com o estilo e imagem colocados pelos seus cuidadores.

A influência dos grupos sociais e das primeiras experiências amorosas também se mostra fundamental na construção dessa identidade e dessa imagem pessoal, revelando pontos cruciais!

À medida que saímos da adolescência e nos aproximamos da vida adulta essa confusão e experiências sinalizam um desfecho.

No que diz respeito à imagem pessoal, não raro observamos uma mescla entre o que fora vivido na infância e as escolhas da adolescência, resultando em algo novo e único!

Em relação a sua identidade, quanto melhor for a resolução das crises anteriores, mais possibilidades existirão para o alcance, nesse momento, de uma estabilização da identidade. É essa estabilidade que, segundo Erikson, promove sentimentos de lealdade e fidelidade consigo mesmo e com seus propósitos.

A tão almejada autenticidade nada mais é do que um senso de identidade coeso, contínuo e coerente! E tudo isso se reflete na nossa imagem pessoal!

6) Intimidade X Isolamento (20 aos 40 anos):

100% das minhas clientes me procuram exatamente no meio desse ciclo. Alô crise dos 30! Quem não passou por ela é porque ainda passará!

Mas o que faz essas mulheres me procurarem nesse momento e não no meio de toda confusão da adolescência? Nesse momento, normalmente, já somos independentes, financeiramente e decisoriamente! Soma-se a isso o fato de a fase adulta ser considerada por muitos como o ponto ótimo de desenvolvimento humano e como o ponto de referência para a avaliação de todas as fases do desenvolvimento humano (ALMEIDA; CUNHA, 2003).

E também ao fato de que aqui ainda temos bastante confusão acontecendo! Consolidação de carreira, estabilização de relacionamentos amorosos, casamento, primeiros filhos... e a lista segue bastante extensa!

Se, por qualquer motivo, essa pessoa teve percalços para estabilizar sua identidade visual até aqui, esse é o momento em ela decide e pode bancar por isso! E vamos abrir o jogo! Essas passagens de ciclo não ocorrem sem percalços e todos nós, em algum momento, ficamos presos ou regredimos em algum ponto.

Acontece que, com a chegada da vida adulta, algumas pessoas conseguem ir desembolando esses nós (muitas vezes com auxílio profissional) e traduzir tudo isso em imagem pessoal satisfatória e relevante aos seus propósitos enquanto outras terão um pouco mais de dificuldade, demandando ajuda profissional. E é aqui que eu entro!

Ao estabelecer uma identidade definitiva e bem fortalecida, o indivíduo estará pronto para uni-la à identidade outra pessoa, sem se sentir ameaçado. Essa união caracteriza esta fase (RABELLO & PASSOS)

Essa associação de identidades não se limita a intimidade, podendo ocorrer com parcerias e colaborações, o que nos leva ao campo da carreira!

Apenas uma identidade forte e autônoma o suficiente é capaz de aceitar o convívio com outras pessoas (marido, filhos, etc.), outras ideias, uma empresa, uma carreira, sem se sentir anulada ou ameaçada.

Quando isso não acontece, a pessoa se sente insegura e tende ao isolamento enquanto medida de proteção. Por curtos períodos esse isolamento pode ser positivo à medida que servir para amadurecer essa identidade e se certificar de que a associação que se teme é realmente a que se quer.

Porém o isolamento por muito tempo limita a nossa capacidade de assumir compromissos e estabelecer relações duradouras com outras pessoas e projetos. Havendo uma tendência para se esconder atrás de armaduras, fantasias (falo no sentido de roupa também) e de uma identidade e imagem pessoal que não representa verdadeiramente quem somos e os nossos propósitos na vida.

O que eu vejo acontecer é que, havendo uma dificuldade nesse amadurecimento, muitas falhas de comunicação surgem, seja da nossa tentativa de estabelecer conexões ou de nos protegermos delas. E acabamos transmitindo uma imagem que não nos representa e não nos ajuda a conseguir os resultados que desejamos.

7) Generatividade X Estagnação (40 aos 65 anos):

A preocupação nesse momento da vida é com o legado! As pessoas se dedicam ao estabelecimento e orientação da geração seguinte e à transmissão dos seus valores sociais e ideias.

Como falei no início, somos seres sociais e o que efetivamente nos diferencia de outros animais é a capacidade de transmitir informações, seja sobre coisas que não existem (valores, crenças, mitos, etc) ou comportamentos e ensinamentos práticos (HARARI, 2018). Portanto temos necessidade de transmitir, de ensinar. É uma forma de sobreviver e de fazer a vida valer a pena.

Isso que Erikson chama de generatividade não se limita a relação pais e filhos, podendo assumir formas variadas como um sócio, uma empresa, uma pesquisa, um livro, etc. Caso essa transmissão não ocorra se desenvolve um sentimento de estagnação.

8) Integridade X Desespero (65 em diante):

A última fase do ciclo vital descrita por Erikson é marcada pela reflexão e retrospectiva do que vivemos. Podendo resultar em sentimento de integridade ou de desespero frente ao fim da vida.

Essa integridade é descrita por Erikson como sendo “a aceitação pela pessoa do seu único ciclo vital e daqueles que se tornaram significantes para ela como algo que tinha que ser e que, necessariamente, não permite substituição.” (ERIKSON, 1972, p.140).

A grande conquista dessa fase fica para a próxima geração, derivada de uma nova edição da crise de identidade representada pela ideia: “eu sou o que sobrevive de mim” (BOSSI et al, 2010)

De uma maneira geral o sucesso nas passagens por esses ciclos vitais é determinado por uma identidade que se torna cada vez mais íntegra, coesa e coerente: “uma personalidade saudável domina ativamente seu meio, demonstra possuir uma certa unidade de personalidade(ERIKSON, 1987, P.91).

E nossa imagem pessoal segue o mesmo caminho!

Estudo da Trajetória de Vida


Como você pôde ver o estudo da trajetória de vida da cliente é importante para identificação de marcos de passagem dos ciclos vitais que coincidem com marcos de construção e amadurecimento da imagem pessoal.

Erikson também chama atenção para esses marcos e, não coincidentemente, os pontos que ele destaca são os mesmos que eu observo na prática clínica como cruciais para o desenvolvimento de uma imagem pessoal saudável e satisfatória. São as etapas de construção da confiança básica, iniciativa, diligência, adolescência e ingresso na vida adulta.

Erikson diz que durante o ciclo vital construímos o que ele chama de plano de vida, um roteiro segundo o qual as crises de identidade se desenrolarão. Para ele, esse roteiro segue esses marcos e consolidamos nosso plano de vida na adolescência: “ao definirmos quem somos, pensamos justamente o que faremos de nossa vida. Consolida-se o plano de vida.”

Acontece que esse plano de vida não é completamente rígido e segue sendo ajustado conforme as passagens futuras. E nossa imagem pessoal segue nesse ajuste.

Por isso o estudo da trajetória de vida se mostra tão importante para auxiliar clientes, identificando seus marcos de passagem, em qual idade viveu cada um desses marcos, em que época histórica e cultural isso se deu e como esse contexto e a cultura predominante nesse momento influenciaram esse processo, quais eram as referências de moda e beleza na época, como era a cultura familiar, quais expectativas foram alimentadas a seu respeito, como seus pais se vestiam...

E pegando esse gancho, lembrando que vivemos em grupos sociais e somos influenciados e pressionados por esses, destaco a importância de se investigar as pessoas de referência para a formação da imagem pessoal da cliente:

- quem a vestiu na infância?

- ela se sentia confortável com o que lhe era “imposto”? Reconhecia-se no estilo em que era vestida ou isso era um ponto de conflito ou incômodo?

- quem ensinou a reconhecer seu tamanho e comprar as próprias roupas? Com que idade isso aconteceu? Como foi a experiência?

- no ingresso à vida escolar, como as primeiras amizades influenciaram (ou não) a sua forma de se vestir? Sofreu bulliyng em função do corpo ou imagem pessoal? O mesmo para outros contextos como: primeiras relações amorosas, primeiro emprego, entrada na faculdade, casamento, nascimento de filhos, etc...

De uma maneira geral investigue tudo que envolva grupos sociais e sua possível influência na maneira como a sua cliente se vestia, via seu corpo, se sentia a respeito da própria imagem.

Todas essas correlações e a importância da Psicologia do Desenvolvimento para o trabalho com imagem pessoal ainda são temáticas pouco exploradas, mesmo internacionalmente. Me dei conta de tudo isso a partir da experiência clínica que foi, posteriormente, validada através de estudos científicos.

O assunto é vasto e comporta muitas considerações. Por hora espero ter conseguido apontar as correlações possíveis entre nossa trajetória de vida, a construção da nossa identidade e a nossa imagem pessoal.

Referências:

ALMEIDA, Ângela Maria de Oliveira; CUNHA, Gleicimar Gonçalves. Representações Sociais do Desenvolvimento Humano. Psicologia: reflexão e crítica, 2003, v.16, n.1, p.147-155. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/prc/v16n1/16806.pdf?origin=publicationDetail

BOSSI, Tatiele Jacques; SANTOS, Anelise Schaurich dos; ARDANS-BONIFACINO, Héctor Omar. O ciclo vital segundo Erick Erikson e a constituição da identidade: experiência com um grupo de adolescentes (2010). Disponível em : http://unifra.br/eventos/sepe2010/2010/Trabalhos/humanas/Completo/5206.pdf

COSMIDES, L., & TOOBY, J. (1992). Cognitive adaptations for social exchange. In J. H. Barkow, L. Cosmides, & J. Tooby (Eds.), The adapted mind: Evolutionary psychology and the generation of culture (pp. 163-228). New York, NY, US: Oxford University Press. Disponível em: http://psycnet.apa.org/record/1992-98504-003

ERIKSON, E. H. Identidade, Juventude e Crise. Rio de Janeiro: Zahar editores, 1976.

ERIKSON, E. H. Infância e Sociedade. 2ª ed. Rio de Janeiro: Zahar editores, 1987.

ERIKSON, E. H. e ERIKSON, J. O ciclo da vida completo. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.

FERREIRA, Lara Cristina Q. Psicologia do Desenvolvimento: desenvolvimento psíquico em Jean Piaget. São Paulo: 2009. Disponível em: http://www.unisalesiano.edu.br/encontro2009/trabalho/aceitos/RE36875218852.pdf

HARARI, Yuval Noah. Sapiens: uma breve história da humanidade. Porto Alegre: L&PM, 2018.

MOTA, Márcia Elia da. Psicologia do Desenvolvimento: uma perspectiva histórica. Temas em psicologia, 2005, v.13, n.2, p.105-111. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-389X2005000200003

RABELLO, ELAINE; PASSOS, José Silveira. Erikson e a teoria psicossocial do desenvolvimento. Disponível em: https://josesilveira.com/wp-content/uploads/2018/07/Erikson-e-a-teoria-psicossocial-do-desenvolvimento.pdf

WINSTON, J.; STRANGE, B.; O’DOHERTY, J.; DOLAN, R. Automatic and intentional brain responses during evaluation of trustworthiness of faces. Nature Neuroscience, 2002. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/11850635

Autor Debora Blaso Moreira

Debora Blaso Moreira

@deborablaso

Psicóloga (CRP04/39485) pela PUC Minas, com formação em Coaching Psychology e em Consultoria de Imagem e Personal Stylist. Estudiosa de Fashion Psychology e fudadora da Re-forma Visual, empresa pioneira no Brasil em Fashion Psychology, onde atua, desde 2016, empoderando mulheres através da imagem pessoal,singularizando o padrão de beleza!

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