Grupo de Gestantes - Sugestões de trabalho

Por mais óbvio que possa parecer, trabalhar com gestantes, além de imensamente gratificante (pelo menos pra mim, que sou uma eterna apaixonada pelo universo materno), é lidar com expectativas muitas vezes irreais. O que torna o processo ainda mais essencial e necessário.
Mas você pode estar pensando: “Como assim, expectativas irreais?”. Já vou explicar melhor!
Expectativa X Realidade
Infelizmente, a “indústria” da maternidade, a mídia e a grande maioria das pessoas, vende uma maternidade que definitivamente não existe. Um romantismo exagerado e irreal, como se tudo fosse um lindo e maravilhoso jardim florido, repleto de momentos incríveis, perfeitos e nada além disso!
Comece a prestar atenção em como são feitas as propagandas de bebê, comerciais de fraldas, de incentivo a amamentação e tudo mais. Surgem frases que literalmente COLAM na cabeça das gestantes, imagens lindas e agradáveis de uma maternidade perfeita ou de uma “amamentação natural”.
E não estou dizendo que não possa ser assim. Realmente a maternidade tem momentos incríveis, agradáveis, deliciosos, maravilhosos, fantásticos e perfeitos. Mas não acontece assim o tempo todo.
Esses dias li uma matéria que falava exatamente isso “A amamentação é um processo natural, mas nem sempre acontece naturalmente!”, profundo, não é?
E não é a apenas a amamentação, mas todo o resto assim também.
Por mais que seja maravilhoso e incrível, natural ou não, nem tudo são flores. E por mais difícil que possa parecer compreender isso, as gestantes muitas vezes idealizam uma maternidade irreal, distorcida e provavelmente mais positiva e fácil do que realmente é!
Não tirei esta informação do além (rsrs), estive recentemente com um grupo de gestantes (e já estive com vários outros) e quando esses grupos de “pré parto” são separados das mamães que já estão vivenciando a maternidade real no pós parto, percebo uma diferença gritante e assustadora entre expectativas e realidade.
Pois por mais que as mães imaginem que pode ser um pouco diferente do que elas esperam, o que tenho ouvido das mamães pós parto é que, definitivamente, foi imensamente mais difícil do que elas planejaram, em diversos aspectos.
E são estes aspectos que podemos explorar para trazer novas oportunidades de trabalho, para nós, psicólogos!
Temas para trabalhar com as gestantes
Acabo de realizar uma roda de conversa entre gestantes que se chamou “Gestar é Aprender”, nela discutimos inúmeras questões: desafios; dores e delícias que a gestação proporciona; expectativas do pós parto e o que realmente acontece em quase todos os casos: frustrações, culpas, choque de realidade!
Mas vamos voltar um pouco.
Ao falar em gestação, já surgem inúmeras possibilidades de trabalho. Quer algumas sugestões?
- Mudanças na aparência física durante e após a gestação:
Você já parou pra pensar no quanto o corpo mulher muda durante e após a gestação?
Essas mudanças podem ser muito assustadoras, desde o tamanho dos seios, até por exemplo, o tempo que pode levar para o corpo voltar a como era antes, ou ainda a possibilidade de que ele talvez nunca volte a ser como era.
Sempre que se pesquisa sobre o tempo que o corpo leva pra voltar ao normal após a gestação se fala de 9 a 12 meses, mas e quando isso não acontece? Conseguem imaginar o quanto mães se sentem frustradas e decepcionadas por isso? A autoestima muitas vezes vai lá para baixo e é nosso papel trabalhar essas questões.
- Como lidar com tantas informações que surgem (muitas contrárias, inclusive):
Quando uma mulher engravida, parece que surgem opiniões de tudo que é canto, todo mundo tem uma receitinha mágica, ou um “faça isso” / “nunca faça aquilo” para distribuir a troco de nada para a gestante.
E isso causa uma confusão e insegurança tremenda!
Eu costumo orientar que elas sempre busquem uma segunda opinião nos casos que tem dúvidas e, melhor ainda, que vejam o que mais faz sentido pra elas, porque algo que faz sentido pra mim, não necessariamente fará pra elas.
- Como lidar com os palpites, pitacos e pessoas desagradáveis:
Isso é sempre uma reclamação constante entre as mães. Como mencionei acima, vem opinião de tudo que é lado e elas tem dificuldade em lidar.
Eu costumo fazer a seguinte reflexão: primeiro que elas tentem compreender que quem está dando os palpites e pitacos não o faz por mal, mas sim com a melhor das intenções e que, se elas forem parar pra pensar, alguns desses “pitacos” certamente já as ajudaram em determinadas situações.
Portanto, não precisam dar tanta importância assim e devem absorver somente o que fizer sentido pra elas, o que não fizer, que “passe reto”!
- Escolha do parto:
Essa, definitivamente é a temática que mais tem incomodado nos grupos que eu facilito, pois as pessoas são tão extremistas com as suas “preferências” de parto que chegam a desgastar as gestantes.
Hoje estamos numa onda de parto humanizado que, sinceramente, eu acho ótimo considerando o número de cesáreas sem necessidade que acontecem atualmente. Mas quando isso é imposto de alguma forma, chega a ser contraditório. Sim, o parto humanizado é um ótimo e excelente caminho, mas enfiar isso goela abaixo nas gestantes (como acontece em ALGUNS casos, não sempre) não é nada humanizado.
Humanizado é, ao meu ver, respeitar o direito de cada gestante em escolher o parto que quiser, seja normal ou cesárea.
Eu costumo mostrar os dois lados da moeda nesses grupos, mostro sobre o parto normal humanizado e também sobre a possibilidade de cesárea humanizada (nós psicólogos PRECISAMOS saber disso e passar adiante, indiferente da escolha que faríamos). Enfim, é um assunto que sempre dá pano pra manga, rs.
- Por que preparar o enxoval e o chá de bebê não é tão importante quanto preparar o emocional para chegada desse filho?
Aqui trago sempre as reflexões a respeito de expectativas X realidade.
Porque nos preparamos tão bem pro enxoval e eventos durante a gestação, mas nem pensamos que o pós parto pode ser tão intenso e difícil em muitos casos, eu diria na maioria deles. Nesses momentos gosto de usar como exemplo pessoas que passaram por coisas que nem imaginavam, tanto para o lado bom, quanto para o ruim.
- E o dia a dia pós nascimento:
Neste eu costumo fazer uma ponte com o tópico anterior. Quanto mais falarmos sobre as dificuldades, sobre maternidade real e o lado "não tão bom assim", mais preparadas as pessoas estarão, pois, infelizmente, o “bebê perfeito do facebook” que dorme a noite inteira desde o primeiro dia de vida, não chora, não quer colo o tempo todo, faz tudo 100% como você planejou, não existe.
As expectativas são criadas com base nas mentiras que as pessoas contam, nas informações que omitem, no medo de admitir que a maternidade não é tão linda e maravilhosa assim quanto se imaginava, no medo de ser criticada ou de dizerem que não é uma boa mãe por isso ou aquilo.
Prefiro preparar as gestantes para a possibilidade de que tudo aquilo que elas esperam saia do planejado - ainda que não aconteça - do que dizer que tudo será perfeito e maravilhoso e depois saber o quanto foi complicado lidar com isso sem o preparo que poderiam ter tido.
Esses temas mencionados acima são apenas alguns, mas temos muitas outras possibilidades.
Desde como preparar o corpo para receber o bebê; o que é importante saber sobre amamentação; o que esperar após o nascimento do bebê; como fazer para lidar com situações que estão fora do controle da mãe; a vida sexual após a maternidade; a vida social após o nascimento do filho; o amor que muitas vezes pode não ser tão instantâneo assim, entre outras questões.
Como trabalhar com o grupo
Eu já trabalhei em vários formatos diferentes com gestantes e vou compartilhar a minha experiência com cada um deles:
Palestras
Em 2015 realizei duas palestras com o tema “Saúde emocional do bebê: quebrando paradigmas”. Nesta palestra a intenção era mostrar para as mães que a saúde emocional do bebê depende muito do que elas transmitem à ele, desde a gestação, até o nascimento e após também. Foi um encontro para derrubar todos os muros de crenças que elas tinham a respeito da maternidade, que muitas vezes não eram verdadeiras.
Para quem assistiu minha Masterclass aqui na Academia do Psicólogo, falando sobre o meu trabalho com mães, sabe que eu não gosto muito de palestras com esse público.
Melhor do que ficar falando, na minha opinião, é permitir que haja trocas de informações, de dúvidas, de diálogo, questionamentos, enfim. Então mesmo neste evento que começou como palestra, terminou em uma deliciosa roda de conversa, onde todos nós discutimos, conversamos, e trocamos muita informação.
Workshop
Em 2016 realizei alguns workshops baseados no meu conhecimento em maternagem e em ferramentas de Coaching Psychology (também aqui da Academia, eu sei, sou fã demaaaaais dos produtos da Academia do Psicólogo ????).
O público alvo eram gestantes e o intuito era gerar autoconhecimento e preparação para o pós parto, para tudo que mudaria na vida dessas mulheres após o nascimento dos bebês e também para acalmar o coração com relação as expectativas e situações que não se pode controlar!
Foi um trabalho realizado em 4 horas, com muitas atividades vivenciais, e trocas incríveis e incomparáveis entre as gestantes!
Rodas de Conversa
Já em 2017, realizei algumas rodas de conversa com o intuito já mencionado acima de falar das expectativas X realidade, do que esperar de fato após o nascimento do bebê e o quanto as coisas podem ser diferentes do que elas planejam.
Engraçado que a visão distorcida e romântica vem por conta da gravidez, que na grande maioria é repleta de momentos maravilhosos, descobertas agradáveis e sensações muito boas. Mas quando a “maternidade real” bate à porta, o desespero muitas vezes toma conta.
E veja bem, não sou eu que estou dizendo isso, são todas as mamães com que eu já trabalhei até hoje. E repito, TODAS, por mais maravilhosa que possa ter sido a experiência da maternidade até então, sempre há algum momento desesperador, assustador, de “balde de água fria” ou algo parecido.
Por isso precisamos falar mais e mais sobre esses temas e deixar que essas mamães sejam acolhidas, ouvidas, respeitadas e, principalmente, que conheçam o lado sombrio da maternidade também.
Grupos Contínuos
Todos os eventos que mencionei acima, forma realizados em encontros únicos, sem continuidade. Porém, houveram trabalhos que tiveram sim uma continuidade, dentre eles, alguns grupos de gestantes, onde foram realizados 10 encontros (um por semana), com 6 pessoas cada, e cada um tinha um objetivo específico, por exemplo:
- Encontro 1: conhecer o grupo e identificar possíveis demandas.
- Encontro 2: identificar e discutir sobre as possíveis dificuldades que elas já enfrentam ao longo do caminho, enquanto gestantes.
- Encontro 3: entender e trabalhar quais são as expectativas dessas gestantes com a maternidade real.
- Encontro 4: falar sobre todas as possibilidades de parto, bem como seus benefícios e riscos.
E assim por diante...
Esse é um tipo de formato que eu ADORO trabalhar e acho extremamente produtivo. As gestantes também costumam dar um feedback muito positivo a respeito dos grupos, pois ali, além de estar com uma escuta de um “especialista” elas trocam informações entre si, e percebem o quanto não estão sozinhas nesta caminhada.
Resumindo:
Trabalhar com gestante é maravilhoso e gratificante, mas implica em muito estudo, dedicação, coração e mente aberta, pois você vai lidar com pessoas de diversos costumes e hábitos, muitos distintos entre si.
Você pode trabalhar com elas de forma individual (psicoterapia) ou em grupo, seja através de palestras, rodas de conversa, workshops, ou grupo de apoio emocional. Basta você identificar qual a maneira que mais lhe agrada e lhe dá segurança.
Já falei isso, mas vou continuar repetindo: você não precisa ser mãe para trabalhar com mães, ok? Por isso, se quiser ser reconhecido e conquistar esse público, mergulhe nele, converse com pessoas que passam por situações assim, busque livros, vídeos, documentários, blogs, páginas nas redes sociais e tudo mais que possa te ajudar.
E por fim, curta cada momento, trabalhar com gestantes é gestar os filhos junto com elas, é se envolver num universo ao mesmo tempo encantador e assustador, com muitas dores e delícias, mas que nos aproxima de uma forma genuína e intensa!

Ana Paula Majcher Petry
@anappetry
Ana Paula Petry é psicóloga com especialização em Terapia Cognitiva e formação em Coaching Psychology pela Academia do Psicólogo. Apaixonada pelo universo da maternagem, atua desde 2011 em atendimentos clínicos, palestras e workshops voltados para pais e educadores. Seu mais novo projeto é o Gestando e Aprendendo.
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