13 Reasons Why – Como a série pode ser uma ferramenta para a Psicologia?

Esse não é mais um texto para criticar ou idolatrar a série mais vista e comentada das últimas semanas. É um texto para falarmos de como podemos usar séries vistas pelos adolescentes como ferramenta para o trabalho de educação emocional com adolescentes, seja na clínica, na escola ou onde a psicologia estiver para auxiliá-los.

Não assisto todas as séries que os meus clientes estão assistindo, mesmo porque, às vezes tenho a impressão que eles conseguem assisti-las na velocidade da luz. Em uma sessão amam uma série e na sessão da próxima semana já amam outra. Comum na adolescência... E eu confesso: amo séries voltadas para o público adolescente.

Afinal, acredito que para sermos bem sucedidos com essa turma temos que gostar um pouco das coisas relacionadas ao mundo adolescente. Até para não sermos só mais um adulto crítico e que não sabe nada sobre a vida deles!

Então vamos lá. Falar dessa tal de “13 Reasons Why”.

Não sei se você já viu, mas se seu foco é trabalhar com adolescentes, te convido a assistir porque nas últimas semanas ela foi assunto de pico entre os adolescentes. Ela pode ser mais uma das séries que viram febre e passam, mas acredito que ainda terá repercussão por algum tempo.

Como eu disse, a minha ideia com esse texto não é dar minha opinião sobre se os adolescentes devem ou não assistir a série, mesmo porque, milhares já assistiram e milhares vão assistir. Muitos amigos, pais, colegas, estão me perguntando o que achei da série e posso resumir desta forma:

Os adolescentes que quiserem irão assistir. A minha questão é: o que você pode fazer para ajudá-los a refletir sobre tudo o que acontece na série?

E o meu convite para você, colega psicólogo, é refletir como podemos tirar o melhor proveito da série para ajudar os clientes adolescentes.

Já aviso que teremos alguns spoilers!

Sempre pergunto para meus clientes o que assistiram ou leram durante a semana. Uso como uma forma de acessar seus sentimentos. Quando falam das séries vou trabalhando como se sentiram, suas opiniões sobre o ocorrido. Como é impossível acompanhar todos, alguns me contam sobre o que viram ou leram e conversamos a respeito.

É interessante conversar com alguém que se interessa pelo que você fala, certo? E com os adolescentes não é diferente. Eles estão cansados de pessoas criticando o que veem e leem. Dizendo que é bobagem, que deveriam ver outra coisa. Então, se interesse VERDADEIRAMENTE por suas histórias e pelo que te contam.

E eu curto mesmo!

Separei alguns tópicos que anotei ao ver a série e como podemos usar com os adolescentes. Se você tiver a oportunidade de assistir, verá que tem muito mais. Escreverei como podemos falar com os adolescentes e trazer esses assuntos para a reflexão, acessar o sentimento dos adolescentes e ajudá-los, aproveitando a série:

Precisamos falar sobre educação emocional


Com as férias de verão Hannah decide mudar e corta o cabelo. Hannah mudou o seu exterior, mas esqueceu de cuidar do seu interior, trabalhar os sentimentos que a atrapalhavam de seguir em frente. Esse recorte nos leva para algumas questões norteadoras: “- O que você faz quando quer começar de novo? O que você acha interessante mudar para ir de encontro a vida que deseja ter?”.

Entre as coisas que afligiam Hannah estava a culpa que ela sentia, seja de como as pessoas a tratavam ou sobre o que pensavam sobre ela. Ao trabalhar com adolescentes, investigue essas questões junto dele: “-Você se sente culpado por algo? É algo que poderíamos falar sobre e analisarmos juntos o que ocorre?”.

Coisas acontecem conosco e com as pessoas ao nosso redor o tempo todo! Mas o que verdadeiramente importa é como reagimos ao que acontece. E esse é outro ponto a ser trabalhado com o adolescente: “- Como você tem lidado com fatos que te afligem?”.

Muitos dos desencontros de Hannah e Clay se deram por que não perguntaram o que realmente o outro estava pensando. Quantas vezes deduzimos o que o outro pensa? É possível trabalhar a comunicação com os adolescentes e também questioná-los: “- Tem alguém que você acha que sabe sobre o que pensa, mas acredita que se perguntasse a resposta poderia ser diferente?”.

Além disso, também podemos aproveitar algumas atividades da série para propor uma forma do adolescente se expressar:

  • A ideia do pacotinho de elogios anônimo apresentado por uma das professoras da escola tem uma ideia bem interessante. Que tipo de elogios você gostaria que tivesse no seu pacotinho?
  • Hannah escreve um poema, onde fala sobre o que sente naquele momento. Como seria o seu poema?
  • Na última tentativa de Hannah ela se dispõe a pedia ajuda. Como você tem ajudado as pessoas ao seu redor? Tem observado que elas precisam de ajuda? Acredita que tem recebido ajuda de quem você desejaria obter?

Outro ponto é o trabalho com o propósito do adolescente: “Eu queria um propósito, uma razão para estar nesse planeta.” Hannah Backer.

Hannah traz a reflexão de como a escola aliena os alunos. Ensinando-os as matérias bases, mas sem se preocupar em desenvolver nos alunos o seu propósito de vida. Podemos ir além com os adolescentes para identificar quais são os seus valores e o que os move no mundo. Aqui temos que construir junto com eles e essa é uma maneira excelente para trabalhar o desenvolvimento pessoal e de sentido para a vida.

Trabalhando com os pais


  • Como você gostaria que os seus pais te vissem? O que eles têm feito que você gostaria que fizessem diferente? Eles sabem como se sente? Como você acredita demonstrar para eles como se sente?

Estas são questões para trabalhar com o adolescente como ele vê os comportamentos dos pais e como gostaria que os pais vissem seu comportamento os ajuda. Assim podemos ter uma visão mais ampla desse relacionamento e a descobrir estratégias de como alterá-lo para melhor.

Precisamos também orientar os pais sobre como estão abordando seus filhos após a escola. Fazer dessa pergunta um gatilho para gerar uma conversa em família. Os pais devem querer saber mais do que sobre as notas. A escola é muito mais que um lugar para se estudar, a escola é um dos principais lugares que aprendemos a nos relacionar em grupos e na adolescência é onde mais queremos ser aceitos.

  • Como os pais tem perguntado aos seus filhos sobre como foi na escola? Eles têm deixado claro que querem saber se o seu filho teve um dia alegre, divertiu com os amigos? Ou apenas sobre o que ele “aprendeu” de matéria, hoje?

Quando perguntamos a alguém: “Como está?” e a pessoa simplesmente responde: “Tudo bem!” e se você percebe que não está tudo bem, alongue a conversa, queira saber mais. Essa pode ser uma orientação aos pais, já que os adolescentes não gostam de ficar dando satisfações, mas gostam que as pessoas se preocupem com eles, que insistamos em saber como realmente estão.

Relações de intimidade


Relações de intimidade são extremamente importantes para nossa saúde emocional. Uma relação de intimidade (rede de confiança) diz respeito a relações que não nos julgam, não nos apontam. E precisamos ter pelo menos uma relação de intimidade.

Ahhh e não vale o terapeuta. A função do terapeuta é auxiliar o cliente a construir essas relações!

Além da rede de relações de intimidade, devemos ter uma rede de apoio, que são as pessoas que podemos contar quando estamos em apuros, por exemplo (uma carona, um dinheiro emprestado...) e uma rede de convivência (rede de grupo), que é um grupo onde temos assunto em comum (seja esporte, igreja, hobbies... por exemplo).

Podemos ver na série a falta de dessas redes de relação na personagem Hannah. O personagem Zack, também não possui a rede de confiança. Apesar de Zack ter uma rede de grupo e de apoio, lhe falta a de confiança. O que faz com que se sinta solitário no meio da multidão.

Vale trabalhar com o adolescente em torno dessa questão: Quais são as suas redes de confiança, apoio e grupo?.

Tem mais!


Agora...

Uma das coisas que mais me chamou a atenção, claro, pela nossa profissão, foi a conduta do Conselheiro.

Diante das falas de Hannah, “perdida, vazia, não me importo mais com nada, nem com os amigos, com a escola, comigo”, sente que é um fardo para os pais... “eu preciso parar com tudo, com a vida...”, a atitude dele não é de acolhida. Muito pelo contrário... ela a julga. E pede para deixar pra lá... já que ela não quer fazer e nem falar sobre o ocorrido.

Deixar pra lá? Ohhhh... pobre conselheiro!

Quando um adolescente conta ou tenta nos contar algo, devemos parar e ouvi-lo. Eles não são de falar muito sobre o que sentem e quando decidem falar, essa escolha não foi fácil e devemos valorizar ao máximo esse momento.

A série apresenta um extra e esse extra também nos traz algumas informações que podemos discutir e analisar com os adolescentes, seus pais e educadores: o suicídio é a segunda maior causa de morte em adolescentes, porém não deve ser visto como uma opção!

A análise com o adolescente de todo o caos que se forma ao seu redor após a sua partida deve ser discutido e, principalmente, isso nos mostra a importância, cada vez maior, de trabalharmos educação emocional nas escolas.

O lóbulo frontal dos adolescentes ainda não está totalmente formado e por isso, sua impulsividade e a crença de que tudo o que sente sentirá para sempre. Essa informação para pais e educadores é fundamental para entenderem mais sobre o comportamento dos adolescentes.

Bem, é isso! Como eu disse no início minha ideia não é falar se a série é boa ou ruim. E sim como podemos tirar o melhor proveito delas para ajudar aos adolescentes.

Achei melhor falar sobre alguns pontos que podemos trabalhar ao invés de escrever sobre 13 motivos para ver a série, 13 motivos para não ver... e tudo isso que temos visto por ai!

A ideia central é: como tiramos proveito do que acontece, seja em nossas vidas, seja na vida dos nossos clientes, seja do que vemos ou do que eles vêem na internet... Acredito no trabalho voltado para o propósito de vida e para uma vida comprometida com nossos valores! Isso que devemos trabalhar com os adolescentes, ajudando-os a entender seus sentimentos e caminhar por um propósito maior.

Tem que melhorar! A forma como nos tratamos, como cuidamos uns dos outros!

Clay Jensen

Autor Renata Lott

Renata Lott

@renatalott

Psicóloga, psicopedagoga, coach e empreendedora com experiência em ajudar adolescentes e jovens a vivenciarem suas novas descobertas através do processo de autoconhecimento e desenvolvimento emocional. Ajudando-os a desenvolver novas habilidades de lidar com o ambiente ao seu redor e, se preciso, orientando pais, professores e orientadores nessa jornada.

MBA em Consultoria Interna, pelo BI International. Curso de Inovação - Berkeley, Califórnia USA. Especialista em Gestão de Negócios, pela Fundação Dom Cabral. Formada em ACT (Terapia de Aceitação e Compromisso) pelo BHDP. Formação em Coaching Psychology, e Intensive Coaching Psychology Experience pela Academia do Psicólogo. Certificada Internacionalmente em Gestão de Mudanças pela Prosci.

Ex Diretora de Ensino no maior cursinho pré vestibular do país - o Kuadro, uma das fundadoras do Acompanhar, Núcleo de Acompanhamento à Criança e ao Adolescente, responsável pelos canais Adolescer no Psico.Club da Academia do Psicólogo e colunista da Revista Mommys (Portal Mommys), com a coluna, Adolescência na Real.

São mais de 20 anos auxiliando estudantes de todas as faixas etárias e despertarem o desejo pelo aprender. E com isso, uma vontade imensa de formar profissionais da área da educação mais conscientes e preparados para poderem ajudar os jovens nesse caminho fantástico da educação!

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