Como melhorar o rendimento do esportista através do treinamento mental

Toda vez que estamos diante de um atleta que teve um fracasso em seu resultado esportivo, a tendência é que se atribua ao desenvolvimento físico a causa de sua derrota. Porém, em muitos casos, a falta de habilidades mentais eficazes é que dificulta o desempenho satisfatório.

O atleta pode ter sentido e pensado que aquele momento era diferente. Mas você ouvirá de inúmeras pessoas que esta é “uma ansiedade normal de jogo” ou que “estas coisas acontecem mesmo com o atleta, mas eu vou me superar”.

Sem dúvida alguma que estas palavras ou pensamentos são válidos para amenizar uma situação real de jogo, entretanto, a ansiedade acontece de forma espontânea e na maioria das vezes sem o controle dos envolvidos.

Sempre ouvimos relatos de jogadores que são excelentes nos treinos e vencem sem dificuldade, todavia, no jogo, quando a partida mostra alguma dificuldade como a torcida contrária em maior número, ele geralmente tem uma queda brusca em seu rendimento. O lado da outra torcida grita o seu nome e o provoca, o que gera tensão e o atleta poderá perder lances fáceis, já que está sem foco e direção dos passes.

Se este jogador pudesse antecipar os estímulos, traçar um plano de ação eficaz para lidar com a torcida adversária e tentasse equilibrar o nível de ativação da ansiedade, certamente ele jogaria bem os jogos fora de casa, pois isto não despertaria tanta perturbação e seu desempenho melhoraria consideravelmente.

O processo parece simples mas a sua aplicação é complexa. Por vezes precisamos encontrar uma forma de alcançar a linguagem deste atleta e demonstrar que o treinamento mental é tão importante quanto o treinamento físico.

Mente e corpo atuarão de forma concomitante.

As habilidades mentais devem ter uma aplicação repetitiva e contundente com o objetivo de aumentar a satisfação do atleta com o esporte e aumentar consideravelmente o desempenho. Nossa intenção será sempre de identificar essa necessidade e aliar as técnicas conhecidas ao longo do desenvolvimento das ciências psicológicas do esporte com estes atletas ou praticantes de atividade física.

A literatura é vasta e com múltiplos olhares sobre as técnicas e métodos de treinamento mental, tais como: controle de atenção, relaxamento muscular progressivo, dessensibilização sistemática, mentalização, diversas terapias, desenvolvimento de metas e treinamento de foco e concentração.

Considerando que as técnicas psicológicas contribuem demais para o desenvolvimento das pessoas, os treinamentos mentais aqui propostos são considerados avanços das ciências nos esportes. Hoje em dia aqueles que não optarem por serviços de psicologia esportiva estarão algumas décadas atrasados no pensamento de uma condução esportiva que dê resultado efetivo.

Hoje sabemos que os fatores emocionais, pensamento e comportamento (entre outras considerações psicológicas) são elementos cruciais para o desempenho no dia a dia.

Os atletas ou praticantes de atividade física necessitam compreender quais são os aspectos psicológicos que estão contribuindo ou dificultando seu rendimento, e a partir daí desenvolver meios de superá-los.

Eu diria que este é o objetivo dos treinamentos mentais: desenvolver aparatos internos para lidar com as adversidades do meio esportivo que estejam interferindo o alcance do potencial físico e mental.

Os esportes exigem do atleta uma intensa rede de conexões para que as decisões que são tomadas em segundos e que farão a diferença para a vida do atleta sejam assertivas.

Um jogador de tênis utilizará suas capacidades mentais para diversos momentos do jogo: ele terá que saber seu nível de ativação para evitar gastar energia desnecessária em uma partida que terá muito tempo de duração; precisa treinar o foco separadamente para jogar a bolinha de tênis o mais longe possível do alcance do adversário e, por fim, precisará desenvolver metas realistas em relação ao alcance de suas conquistas.

Se você praticou atividades físicas ou esportes, certamente teve que lidar com erros e declínio das funções mentais. Ou então observamos outros praticantes que passam pelas mesmas dificuldades.

É comum vermos reações como:

  • Estagnação em momentos decisivos da partida;
  • Tristeza por não se recuperar de uma lesão no tempo esperado;
  • Desmotivação para praticar esportes ou atividades físicas;
  • Falta de envolvimento na competição;
  • Irritação e frustração com seu próprio desempenho.

Inversamente a estas situações descritas acima temos atletas que experimentam o ápice de suas capacidades mentais e tudo parece estar em concordância para seu desempenho e bem-estar.

A importância dos treinamentos mentais é enfatizada nos seus resultados por desenvolverem mais concentração, condições para lidar com situações adversas e frustrantes como as derrotas, resistência mental e capacidade de persistir.

Hoje em dia, o equilíbrio entre as duas formas de treino (físico e mental) tem se equilibrado de forma contundente, configurando-se como fator obrigatório nas preparações para a competição, e não complementar como há pouco tempo atrás.

Será que todos os atletas aceitam este tipo de intervenção?


Obviamente os treinamentos mentais poderão ser considerados somente por atletas que aderirem a proposta que deve ser feita sem pressão. Uma das razões para muitos atletas rejeitarem este tipo de atividade está inserida na ideia cultural de que a psicologia trata de loucos e nunca de pessoas saudáveis.

Por esta razão a importância de cada vez mais enfatizarmos que nossa entrada tem como objetivo a melhora do desempenho. Muitos psicólogos que atuam com esportes preferem usar termos diferentes do que tradicionalmente se caracteriza uma intervenção. Por exemplo você pode usar a nomenclatura “Mapeamento” no lugar de “Diagnóstico”, ou pode usar “Scoutch Comportamental” ao invés de “Análise do Comportamento”.

Estas pequenas diferenças fazem os jogadores ficarem mais a vontade.

Mesmo assim os fatores culturais não são suficientes para explicar a resistência ao trabalho. Por falta de conhecimento, muitas pessoas associadas aos esportes ou exercícios físicos tentam estimular fatores mentais intrínsecos com palavras. O famoso “vamo, vamo, vamo” de técnicos para incentivar os seus jogadores é uma marca deste estilo de pedido.

Outros exemplos são os pedidos de concentração ou falar que a pessoa precisa diminuir a ansiedade... Isso simplesmente não funciona. Se uma pessoa não consegue exercer uma atividade sem diminuir a ansiedade durante os treinos e outros jogos na competição, por qual razão ela conseguirá melhorar os índices da ansiedade somente se ouvir o incentivo de outro jogador na preleção?

Outra questão que é bastante confundida é a palavra dom. Os grandes atletas já tinham em sua constituição habilidades físicas e mentais diferenciadas, mas se não passassem por experiências que estimulassem e potencializassem seu desenvolvimento de forma excepcional, certamente seriam atletas comuns.

Michael Jordan tem uma famosa declaração de que praticava vários e vários arremessos. Errou demais, porém desenvolveu habilidades mentais importantes para a prática do basquete como o foco e concentração.

Então é um erro dizer que alguma pessoa não precisa exercitar suas habilidades mentais, independente do motivo. As habilidades mentais são exigidas em todos os momentos.

Por fim o fator tempo é alegado por muito técnicos e atletas para a não prática de treinamentos de habilidades mentais. Mas geralmente acontece o inverso quando se há o fracasso nas competições, pois aumenta-se o tempo de treinamento físico e tático mesmo quando o fator da perda acontece por conta de uma ausência de eficácia mental.

As efetividades destes programas de treinamento mental dependem de uma intensa busca de medições, ou seja, você precisará se certificar que os resultados obtidos tenham efeito prático e de registro. Para isto você deve contar com bancos de dados que apresentem resultados tanto em competições quanto em treinamentos.

As análises criteriosas sobre testes e inventários que mostrem a personalidade, ansiedade e motivação podem ser excelentes indicadores iniciais e comparativos finais dos resultados obtidos através destes programas de treinamento mental.

Etapas de uma realização de treinamento mental


Para lidar com a resistência temos que ter a ideia inicial de que os atletas provavelmente nunca tiveram contato com um programa de treinamento mental, mas certamente eles sabem a importância destes aspectos no seu desempenho.

Devemos considerar todas as experiências vividas por estes atletas, já que eles sabem que quando estão com um declínio de suas capacidades mentais a tendência é que seu rendimento seja bem menor do que outras ocasiões. Ele sabe que se houver um problema pessoal suas reações físicas serão afetadas.

Por estas razões, é difícil encontrarmos um atleta que opte por treinamentos mentais de forma tão frequente quanto a forma física.

Devemos ensinar as etapas de treinamento explicando a eles que a mente tem alguns mecanismos de funcionamento que são típicos e, até certo ponto, controlados (quem dera pudéssemos controlar totalmente a mente não é mesmo?).

Este primeiro momento vai demandar muitos encontros para explicação e deve estar totalmente alinhado com a vontade do atleta ou praticante de atividade física para que dê resultados futuros. Para isso, recomendo explicar as consequências de cada falta de estimulação para o desenvolvimento nas competições. Personalizar as tarefas é tão importante por esta razão, ele trará a noção real das necessidades deste atleta.

Um exemplo de como desenvolver este primeiro momento poderá ser explicado nos fatores da motivação.

Se um atleta não consegue saber em que situação está e onde quer chegar, a tendência é desistir de suas tarefas já que não percebe evoluções. Por isso, exercícios de auto monitoramento são importantes nesta fase inicial voltadas para seu estado mental de mais ou menos consciência.

A fase seguinte de compreensão dos ensinamentos volta a sua atenção para estratégias e métodos utilizados para obtenção das habilidades mentais. Este meio de atuação pode ter continuidade além do espaço formal de atendimento, ou seja, o atleta poderá realizar estes exercícios tanto nos treinos, competições e até mesmo em casa.

Depois que este atleta consegue adquirir habilidades de enfrentamento utilizando-se de estratégias que combatam suas dificuldades mentais, o acompanhamento psicológico deve dar o suporte necessário para que se mantenham as ações advindas dos treinamentos. Por isto que podemos ter atletas que conseguem exercitar os treinamentos antes mesmo do que fora combinado antecipadamente já que a premissa é que ele desenvolva a autonomia em seus treinamentos.

Vamos supor que um atleta ou praticante de atividade física esteja passando por momentos de muita tensão muscular devido a aproximação de fases mais agudas da competição e isso vem impedindo que ela exerça seu melhor papel. Partindo do princípio de que o estresse é gerado por múltiplas causas, inclusive o modo de percepção das situações e fatores corporais, existem dois caminhos a serem seguidos: estratégias cognitivas de mudança de pensamento da situação e técnicas de relaxamento para diminuir a tensão muscular.

Após a aprendizagem e domínio das técnicas e estratégias do atleta, é hora de partir para situações cada vez mais próximas de um jogo. Uma vez que ele automatiza o processo e realiza treinos periódicos, ela poderá simular situações próximas ao que está vivenciando, tornando assim o estímulo cada vez menos ameaçador.

Isto pode ser registrado de várias formas, inclusive com um registro diário das sensações, sentimentos e pensamentos. Esta fórmula é bem recebida por atletas e praticantes de atividades físicas, pois aparecem como uma forma de incentivo já que percebem as melhoras. Estas melhoras precisam ser honestas e reais.

O uso das técnicas de mentalização ajuda a antecipar estes estímulos estressores. Nossa função como profissionais é usar a criatividade para promover situações reais de jogo que aproximem do momento presente. Recursos como vídeos, áudios e imagens podem ser usados. Neste sentido, lembre-se de que o psicólogo do esporte precisa mudar os jeitos tradicionais de atuação sem perder o foco no atendimento psicológico.

Esta independência do esportista deve ser buscada a todo instante considerando que ele dependa cada vez menos da atuação profissional. Ele deverá ser capaz de integrar todos os conhecimentos obtidos através dos treinamentos mentais e se autorregular, isto é, estar preparado para controlar na medida do possível seus pensamentos, sentimentos e comportamentos na busca por uma meta efetiva e realista em seu esporte.

Em que momento deve-se aplicar um treinamento mental?


Eu diria que o ideal para que você inicie um treinamento mental dentro de uma equipe ou praticante de atividades físicas é fora de temporada ou bem antes do início de prática das atividades. Mas é de se esperar que mesmo no início das competições ainda exista a aprendizagem ou desenvolvimento das habilidades mentais.

Neste sentido não devemos prometer nenhum tipo de milagre ao entrar em uma equipe ou local de atividades físicas. O programa deve ser aplicado e aceito da mesma forma que os treinamentos físicos para surtir os efeitos.

Os discursos podem vir atrelados a pedidos com situações urgentes de equipes esportivas como por exemplo a iminência de um rebaixamento ou recuperação de resultados adversos em competições de eliminação.

Para aceitar este tipo de pedido, é importante que ele venha acompanhado de planos de longo prazo, já que somente um trabalho de construção científica tem verdadeira validade do ponto de vista da psicologia esportiva.

O tempo e os dias necessários para a aplicação dependem da dinâmica institucional. Você avaliará se são necessárias aplicações dos treinamentos de habilidades mentais antes ou depois de jogos e competições. Mas geralmente temos a ideia de que 10 a 15 minutos em um quadro geral são interessantes para o início dos treinamentos seguidos de 3 a 5 dias por semana de atuação durante a fase de preparação para os treinos e competições.

Como dito anteriormente, a tendência é que este atleta possa fazer as lições até mesmo fora dos espaços de treinamento. Mas antes que isto aconteça, o monitoramento dos profissionais deve ser executado de forma rotineira.

Para um melhor aproveitamento, sugiro que a explicação das habilidades mentais seja feita em grupo e depois partir para sessões individualizadas. Além disso, a parceria com técnicos e outros membros da comissão técnica podem contribuir, realizando exercícios voltados a melhora da prática, assegurando assim a adesão ao treinamento mental.

Aplicação dos treinamentos de habilidades mentais


A primeira etapa é de desmistificar a entrada de um psicólogo do esporte em uma equipe esportiva. Ao explicar que nosso trabalho será o de ensinar o desenvolvimento das habilidades mentais, a imagem do psicólogo clínico clássico poderá ser desfeita.

É importante que quando nós nos depararmos com transtornos mentais mais graves possamos esclarecer que estes atletas serão encaminhados para um tratamento psicológico associado a clínica, mas que esta não é sua intenção inicial ao adentrar os campos de treinamento ou de atividades físicas.

A imagem que o psicólogo esportivo demonstra é de ser uma pessoa que estará disponível para potencializar as habilidades dos atletas e não para apontar quais os “defeitos” que eles apresentam.

Evidentemente que as questões que sejam dificultosas para que o esportista desempenhe o melhor de si devem ser sempre consideradas, mas a ideia de que você será alguém que corrige ao invés de estimular, gera dúvidas e medos. Seja claro em sua mensagem.

Por isso o estabelecimento de um vínculo de confiança deve ser feito para evitar desconfianças. Dizer aos atletas que o que for dito de forma pessoal não será aberto para outras pessoas, principalmente o técnico, ajudam a alimentar uma relação de confiança.

Depois que estabelecemos essa entrada de forma eficaz é o momento de avaliação das habilidades mentais.

Certamente que ao chegar neste ponto você compreendeu que o mau desempenho une fatores físicos e mentais. Então obtenha o máximo de informações sobre este participante. A aproximação de membros da comissão técnica será sempre necessária, pois em pouco tempo irá evidenciar a relação de rendimento que você precisa.

Estas são dicas importantes no momento de considerar uma intervenção de treinamento mental já que assim você poderá acompanhar se um atleta atua de forma diferente do que demonstra nos treinamentos.

Vale ressaltar que o uso de ferramentas, questionários e inventários devem ser respaldados por critérios científicos comprovados. Este participante também deve ter total compreensão do que se pretende com o exercício de avaliação. Você poderá utilizar entrevistas semi-dirigidas personalizadas e voltadas para as principais habilidades mentais e como elas vem sendo desenvolvidas pelo participante.

Por fim, depois de todas estas etapas, podemos dar um feedback para os participantes tanto em forma oral quanto escrita ressaltando tanto suas forças quanto áreas que necessitam de maior desenvolvimento voltado ao esporte. Ao identificar estas necessidades, um programa de treinos mentais deve ser proposto e ser acordado com o participante em questão.

Para um grupo grande você precisará de auxílio tanto de outros membros da comissão quanto de psicólogos auxiliares para compreender e dar andamento aos treinamentos. O processo é bastante trabalhoso, mas nutre resultados individualizados. O mercado está cheio de pessoas que utilizam técnicas pré-estabelecidas e que prometem milagres mesmo não sabendo as reais necessidades. Eles agem com sorte, mas recomendo você agir com respeito às pessoas e à ciência.

Você deverá ouvir a comissão técnica e os jogadores sobre quantas semanas de treinos estão disponíveis, quantos dias de treino serão dedicados durante a semana para os exercícios mentais, o quanto eles se interessam pelo treinamento mental e se haverá tempo para a prática do treinamento mental no começo da competição.

É interessante proporcionar aos participantes de breve duração e de forma frequente, ao invés de encontros longos e com muita distância entre um encontro e outro.

Este é um momento em que a atuação do psicólogo poderá ser decisiva na implementação do treinamento mental, já que estabelecemos a confiança necessária e educamos as pessoas a aderirem ao treinamento (aqueles que espontaneamente optaram por realizar).

Por fim, o melhor a se fazer será uma reavaliação periódica dos resultados obtidos. Este é um compromisso que deverá ser firmado com estas pessoas para comprovar a eficácia dos treinamentos. Ela fornece um panorama individualizado que permite a mudança de estratégias caso seja preciso. Você poderá tomar a mesma medida anterior adicionando algum elemento que julgue importante a partir das observações que obteve durante o tempo de aplicação.

Autor Eduardo Souza

Eduardo Souza

@eduardopsicologo

Psicólogo e Coach de Alta Performance da Seleção Brasileira de Parataewokondo (SBPTKD). Palestrante e idealizador de cursos e workshops pela Academia do Psicólogo. Psicólogo do Instituto Olga Kos de Inclusão Cultural através do Esporte (Karatê-Do e Taewokondo). Membro do Núcleo de Pesquisa do Instituto Olga Kos. Psicólogo e Coach da Differenza Serviços em Psicologia. Comentarista do Programa Rock Esporte pela Rádio Conectados Web Especializando em Docência das Ciências do Esporte pela Universidade Cândido Mendes.

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