Hábito de Estudo Saudável – Ele existe? Como auxiliar adolescentes

O que é para você um hábito de estudos saudável?

Segundo a Análise do Comportamento, o verbo “estudar” resume inúmeros comportamentos. Alguns exemplos: Sentar-se e folear o material acadêmico, organizar o material, fazer a lição na escola ou de casa, ler um texto, responder as perguntas...

Então, a pessoa que possui esse tal hábito de estudo adequado emite diversos comportamentos que compõem a classe de comportamento mais geral denominada “estudar” e, muitas vezes, alcança o desempenho escolar que almeja exigido pelos pais, a sociedade e a escola.

Recebo muitos casos clínicos e de orientação de adolescentes que não possuem esse tal hábito de estudos. Uma das primeiras coisas que faço é verificar o histórico familiar e de estudos desse adolescente: “- Como foi e como tem sido sua vida escolar?”.

Devemos ficar atentos também, as limitações orgânicas. Durante o processo e verificação desse histórico escolar e de vida do adolescente, eu solicito aos pais um mini-checkup médico.

Muitos psicólogos se aprofundam em dificuldades psicológicas e comportamentais e se esquecem de verificar a parte biológica. Essa verificação é fundamental, principalmente, se tratando de queixas escolares. O mini-checkup seria uma consulta com o oftalmologista, o endocrinologista e o otorrinolaringologista. Esses, para descartar problemas de visão, hormonal e audição.

Não são 1 e não somente 10 casos que recebi de adolescentes que nunca passaram por esses profissionais e que apresentam alguma alteração em pelo menos uma dessas áreas. Outros exames ou avaliações, solicito de acordo com cada cliente. Mas esse mini-checkup não podemos deixar passar. São tidos como básicos.

Podemos precisar também de avaliações fonoaudiológicas, neuropsicológicas, psicopedagógicas... Mas, qualquer outra intervenção deve ser feita após os exames básicos. Ou, no mínimo em paralelo, mas nunca descartando-os.

Outros fatores a serem levados em conta: Fatores como maus tratos, família desestruturada e falta de algumas condições básicas influenciam diretamente no contexto escolar do adolescente.

Minha ideia, nesse texto, é trabalhar clientes padrões, sem alterações graves no contexto social, familiar ou biológico, focando no hábito de estudo em si. Quando alguma dessas alterações aparecerem, devemos primeiramente resolvê-las para depois iniciar o processo de introdução de um hábito de estudo saudável. Muitas vezes, dependendo do grau de alteração, podemos fazer em paralelo.

Agora sim, vamos olhar para os hábitos!

Devemos analisar junto ao adolescente, à família e à escola: o que está acontecendo, onde está o “problema” de não se ter o hábito de estudos.

Vamos separar em três observações a serem feitas:

  • Fatores que antecedem a possibilidade de não se ter o hábito;
  • Como o adolescente aprendeu a estudar; e
  • Como os pais e a escola tem administrado esse momento de criação do hábito.

Estou colocando em linguagem simples e sem muita teoria da Análise do Comportamento para que psicólogos de outras abordagens possam me acompanhar de forma, digamos, mais simpática. Não que a Análise do Comportamento não seja simpática, muito pelo contrário, a amo de paixão, afinal é a abordagem que sigo... mas quero que o canal tenha uma linguagem que converse com todos os “adolescentes” digamos. J

Continuemos...

Vou destrinchar cada uma dessas observações que devem ser feitas, fatores que antecedem a possibilidade de não se ter o hábito. Vamos verificar local de estudos desse adolescente, a iluminação, a existência de estímulos visuais, auditivos e sociais, horários de estudo e material de estudos.

Como o adolescente aprendeu a estudar


Alguém ensinou esse adolescente a estudar? Ou esperam que ele desenvolva esse hábito sozinho? Afinal, todo mundo nasce sabendo estudar, certo? É a única coisa que ele tem para fazer na vida! #sqn

Devemos ficar muito atentos a isso! Muitas vezes os pais não se dão conta de que nunca sentaram com seu filho para ensiná-lo a estudar.

A escola, na correria do dia a dia, não percebe que alguns adolescentes não conseguem aprender somente com a apresentação da coordenadora pedagógica no primeiro dia de aula... Aliás são pouquíssimos que estão atentos à essas dicas.

E não aprendem não somente porque não estão atentos, talvez porque a forma de dar orientações gerais de como um bom aluno aprende ou de dar orientações se baseando em como aprendiam quando crianças simplesmente não entram tão fácil assim na cabeça. E mesmo que os pais tenham sentado com ele ou a coordenadora da escola foi a maneira eficaz para ele aprender?

Sabemos que cada um tem o seu jeito de aprender. O olhar atento a maneira de como esse adolescente estuda é muito importante. Ele será a pessoa que mais poderá passar informações sobre a sua própria forma de aprender.

A escola e os pais têm costume de não ouvir esse adolescente (salvo exceções) e é nosso dever como terapeuta fazê-los parar e refletir sobre isso. 

Costumo perguntar aos pais:

  • Como você estudava?
  • Dava os resultados que você desejava?
  • Como te orientaram a estudar?

A vida é corrida e ter um momento para os pais pararem e pensarem em como estão auxiliando os seus filhos no processo de aprendizagem é fundamental. Verificar com os pais e a escola como eles têm agido quando o que tem ensinado não funciona para o adolescente: quando o adolescente não tira notas satisfatórias nas provas, o que os pais e a escola têm feito?

Sabemos que apresentar punições não funciona da maneira como eles desejam. Os reforçadores têm mais aceitação pelos adolescentes, e para todos nós, do que as punições.

Como assim, Renata? Se o adolescente tirar nota baixa eu vou achar legal?

Não!!!

Você vai ler a prova com ele e identificar os seus aprendizados, reforçar com um olhar, um parabéns, um abraço, o que ele aprendeu.  E identificar o que ele não aprendeu e buscar juntos, algumas alternativas!

Entende a diferença?

É essa mudança de comportamento que devemos ensinar aos pais.

É fácil para os pais verem os comportamentos problemas desse adolescente que não tem bons resultados, mas é extremamente difícil ver os comportamentos de melhora. Normalmente os pais querem que o adolescente que tirou nota 2 tire na próxima prova 10, após a nossa intervenção e orientação escolar. Mas se esse aluno tirou 5 já é uma grande melhora.

Temos em nossa cultura que a punição educa, mas na verdade ela apenas diz o que não é certo, a punição não ensina o que é adequado. O importante é verificar com o adolescente quais os pontos de melhora. Não onde errou, mas os pontos a melhorar.

Como montar uma agenda de estudo para um adolescente?


Antes de iniciarmos o processo de organização de horários devemos analisar como está o ambiente de estudo, em casa, desse adolescente.

Pedir ao adolescente que tire foto desse ambiente para nos mostrar é uma boa opção. Pedir que ele feche os olhos e lembre os cheiros, os sons e o que mais sente quando está sentado nesse ambiente para estudar, também. Vamos trabalhar com o adolescente se esse local é realmente o melhor ambiente de sua casa para que ele possa estudar.

Precisamos, antes de tudo, quebrar alguns dos nossos paradigmas. E assim ajudar aos pais a quebrar os seus.

Como é, para você, que está lendo esse texto, o melhor ambiente para se estudar em casa?

Se você consegue pensar apenas naquela mesa limpinha, que contém somente o material que vai usar na hora, com poucos estímulos visuais e auditivos... PARA TUDO! Temos que lembrar, pois psicólogo também esquece, que somos seres únicos. E assim como cada um tem sua dor, sua alegria, tem também sua maneira de estudar.

Ahh... mas a maioria das pessoas que estudam e tiram notas boas estudam dessa forma.

Sei não... A experiência que tenho, de mais de 15 anos trabalhando e orientando adolescentes com estudos, me mostra que assim como em tudo na vida... cada um é cada um! E temos que respeitar esse “cada um é cada um” quando tratamos de estudo também.

Os adolescentes estão cansados de falas como:

  • Sempre foi assim e é assim que dá certo.
  • Eu estudei assim e você vai ver como é melhor.
  • Sou coordenadora há anos e TODOS os alunos que estudam assim se dão bem.

Eles querem ser ouvidos! Eles querem fazer diferente! Eles querem descobrir novas maneiras de estudar. Não tem receita de bolo! Tem sim, uma dica simples: escutar o adolescente e construir com ele.

Mas se não tivermos uma linha para seguir, um campo seguro para seguirmos, ficamos perdidos também. Por isso a ideia desse texto. Você tem que ter uma ideia da melhor maneira de estudar. Nem que seja a tradicional. O nosso diferencial, como psicólogos, dos outros orientadores educacionais (salvo exceções) é a escuta! Orientamos o adolescente depois de ouvi-lo.

Ok. Analisamos com o adolescente o melhor local de estudos. Agora vamos fazer essa agenda?

Ao organizarmos a agenda de estudos, com o adolescente, devemos ficar atentos às atividades que esse adolescente gosta. O melhor é montar com ele primeiramente e depois, convidar um dos responsáveis para participar desse momento também.

No nosso encontro com o adolescente ele vai nos falar de toda a sua rotina e vamos organizando de maneira que não atrapalhe nenhuma de suas atividades reforçadoras. O horário de uma aula de violão, o inglês, a hora do jogo online com os amigos, eles têm agora, até o melhor horário para as conversas no whatsapp.

A hora do estudo deve ser em um horário combinado. Nunca imposto! Claro, que talvez algumas coisas tenham que ser remanejadas. Mas sempre em acordo com o adolescente. Sempre! Não adianta ser o melhor horário para os pais, se para o adolescente, não é.

Pronto! Organizamos a agenda e separamos um horário de estudos.

Um tempo interessante para separarmos é em torno de 2 horas. Se for um adolescente do ensino médio, ele consegue se concentrar mais tempo. Lembrando que temos que ter intervalos! Alguns estudos mostram que fazer intervalos de 25 em 25 minutos ajuda e faz render o tempo. Encontramos a técnica Pomodoro, para exemplificar e como dica de uso. Ela consiste em fazer tempos de 25 e intervalos de 5 minutos.

Ou seja, o adolescente senta para estudar e durante 25 minutos não pode mexer no celular, levantar para ir ao banheiro, (nada!) apenas fazer sua atividade. Depois ele tem 5 minutos para ir ao banheiro, ver o celular, ouvir uma música... o que for melhor para ele. E depois retorna.

Existem vários aplicativos de celular que ajudam no seguimento dessa técnica. Alguns até bloqueiam outras funções do celular no tempo dos 25 minutos de estudo.

Depois de quatro tempos de estudos, que totalizam 2 horas, no lugar de fazer 25 minutos de estudo e 5 de pausa, passamos para 20 de estudos e 5 de pausa. Mas seria interessante para alunos do ensino médio, que são maiores e conseguem se concentrar mais.

Eu tenho estudado com o método pomodoro faz uns 6 meses e, para mim, tem dado muito certo.  O tempo que eu estudava 4 horas passaram para 4 tempos de 25/5, ou seja, 2 horas.

Essa é uma ideia que você pode passar para o adolescente, mas não significa que seja a melhor. Normalmente quando eles estudam em horários pré-estabelecidos, em conjunto, tendem a ter um desempenho melhor do que horários impostos. Verificar com eles como estão indo os estudos, se o horário é adequado, se ele teve alguma ideia que quer implantar no seu esquema de estudo, tem que ser uma constante no processo de orientação escolar.

Parar e ouvir


Vamos retomar o que verificamos aqui:

  • Sentar com o adolescente e os pais e ouvi-los.
  • Sentar com o adolescente sozinho e ouvi-lo;
  • Organizar com o adolescente a melhor forma de estudar e fazer sua agenda de maneira com que ele não tenha desculpas de não ter conseguido.

Minha ideia com esse texto é que possamos quebrar os nossos paradigmas e não tentar tomar como verdade alguma maneira de estudar. Como já disse em outros textos, a vida exige mais, a escola exige mais, os pais exigem mais e temos que PARAR junto a esse adolescente e ver o que ele pensa e sente.

Escuto muito: "- Ele tem 15 anos e acha que já sabe tudo. Eu com mais de 40, com muita experiência e ele não quer me escutar".

Os pais precisam parar com seus filhos e ouvi-los antes de impor. Um adolescente com 15 anos não sabe tudo, nem um adulto de 40 e nem nós psicólogos, com a idade que tivermos, também não sabemos. Estamos em construção.

O que temos que lembrar a esses pais que nos pedem orientação é que 15 anos é muito tempo, e que as novas gerações sempre terão mais acesso a informação que a geração anterior. Então eles têm que, novamente, PARAR e construir esse caminho juntos.

Desculpe se sua ideia nesse texto era aprender muitas técnicas para aplicar sobre hábitos de estudo. Mas é assim que trabalho e queria dividir com vocês. Sim! Existem muitas técnicas, mas temos que testá-las em nós, primeiro, acreditar nelas e apresentá-las como ideias para os adolescentes.

Bem assim: "- Olha, eu aprendi essa nova técnica para estudar e tem me ajudado muito. O que você acha de tentar?". Não sou a favor de lermos algo bem científico e querermos “impor” ao adolescente como se fosse a melhor técnica, super comprovada e tudo o mais!

Pense, para você psicólogo: Como tem estudado? O que tem dado certo para você?

E se achar interessante, passe para frente! Exemplo! Mais do que tudo o que orientamos aos pais que ensinem aos seus filhos, nada melhor do que o exemplo!

Obrigada por me acompanhar até aqui.

Autor Renata Lott

Renata Lott

@renatalott

Psicóloga, psicopedagoga, coach e empreendedora com experiência em ajudar adolescentes e jovens a vivenciarem suas novas descobertas através do processo de autoconhecimento e desenvolvimento emocional. Ajudando-os a desenvolver novas habilidades de lidar com o ambiente ao seu redor e, se preciso, orientando pais, professores e orientadores nessa jornada.

MBA em Consultoria Interna, pelo BI International. Curso de Inovação - Berkeley, Califórnia USA. Especialista em Gestão de Negócios, pela Fundação Dom Cabral. Formada em ACT (Terapia de Aceitação e Compromisso) pelo BHDP. Formação em Coaching Psychology, e Intensive Coaching Psychology Experience pela Academia do Psicólogo. Certificada Internacionalmente em Gestão de Mudanças pela Prosci.

Ex Diretora de Ensino no maior cursinho pré vestibular do país - o Kuadro, uma das fundadoras do Acompanhar, Núcleo de Acompanhamento à Criança e ao Adolescente, responsável pelos canais Adolescer no Psico.Club da Academia do Psicólogo e colunista da Revista Mommys (Portal Mommys), com a coluna, Adolescência na Real.

São mais de 20 anos auxiliando estudantes de todas as faixas etárias e despertarem o desejo pelo aprender. E com isso, uma vontade imensa de formar profissionais da área da educação mais conscientes e preparados para poderem ajudar os jovens nesse caminho fantástico da educação!

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